quinta-feira, 23 de março de 2017


Vivemos num mundo de consumo desigual e irresponsável. Desigual, em termos de sua distribuição pelo planeta (20% da população do planeta mora no hemisfério norte e consome 80% dos recursos do planeta; enquanto os 80% restantes, que moram no hemisfério sul, onde nós nos localizamos, consomem 20% dos recursos do planeta). Desigual, também em termos de sua distribuição pelas classes sociais – todas, igualmente atingidas pela publicidade que mobiliza para o consumo, de uma diversidade e quantidade de produtos cujo valor não está ao alcance do bolso de todos.
Com isso, temos dois problemas sérios a encarar:
1 – O esgotamento dos recursos do planeta, que não mais permitem um consumo irresponsável, já que nossos recursos naturais tendem a se esgotar, e que vivemos hoje uma crise ambiental. Se consumíssemos todos segundo o tão decantado “american way of life”, precisaríamos dos recursos naturais de 5 planetas. E, hoje, temos um só, com o equilíbrio e recursos comprometidos.
Em menos de oito meses, a humanidade usou o saldo de recursos naturais de um ano inteiro da Terra, segundo dados da Global Footprint Network, um organismo internacional de sustentabilidade com sedes na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos. Desde 13 de agosto de 2015, o nosso planeta já está “no vermelho”.
– Por isso, em nome da sustentabilidade do planeta, o consumo hoje tem que ser repensado, de modo a torná-lo consciente, sustentável e de qualidade.
Grupos se formaram em alguns países, para estimular a reflexão crítica sobre o consumo. Como, por exemplo, o espanhol “Consuma hasta morrir”, que pretende trabalhar com a contra-publicidade. Como quando, um dia depois do lançamento de uma propaganda de vodka, aparece na tv uma nova propaganda – um velório, tristeza, um caixão no meio da sala e, cobrindo-o, uma bandeira preta com… a marca da vodka que anunciara na véspera. Outra experiência interessante é a que nasceu no Canadá e se espalhou pelos Estados Unidos, e que se intitula “Who needs that?” (Quem precisa disso?).
Na Europa, finalmente temos o apelo ao desconsumo. Para termos uma ideia concreta do que estamos falando aqui, no início do século passado, uma família de quatro pessoas mediamente bem de vida era circulada por cerca de 150 a 200 elementos por toda a sua vida, vestidos e talheres inclusos. Atualmente estimamos em 20.000 o número de objetos, inclusos eletrodomésticos e gadgets repetidos (quem é que não tem em casa um celular antigo esquecido na gaveta, mas que ainda funciona?) com que uma pessoa pode fazer contato no decorrer de sua vida, desenvolvendo muitas vezes uma consequente psicopatologia…
(…)O “ter” é cada vez mais old fashion, fica a dica!
2 – O estímulo e sedução para o consumo atinge igualmente quem tem, e quem não tem os meios de realizá-lo. “Bons valores” devem dar conta de reprimir o desejo não realizável, inclusive das crianças.
– Ocorre que a contenção e superação dos desejos não realizados exige, entre outras coisas, uma maturidade que as crianças não têm, e que vão construindo ao longo da vida. Mas, enquanto isso não ocorre, não é pouco comum a apropriação indevida do produto/objeto-do-desejo, tão sedutora e insistentemente anunciado.
– O estímulo ao consumo, via publicidade – explícita ou não (como no caso de merchandising) tem um espaço privilegiado na grande mídia e, particularmente, na TV.
Nossas crianças são as que assistem a mais tempo de televisão. E – estranha coincidência – são as mais precocemente erotizadas.
Além de  modelos e valores, que absorvem via programação e publicidade, há toda uma indústria que estimula e responde a isso.
Como exemplos, podemos lembrar o fato das meninas agora brincarem com a boneca… Barbie, ao invés de brincar de mamãe-filhinha com uma boneca em forma de nenê. Ou seja, mais do que um treino de maternagem, é um modelo de beleza que as meninas são chamadas a introjetar desde cedo. Os sapatinhos e sandálias de meninas acima de cinco anos já vêm com saltinho. As Casas Pernambucanas, há pouco tempo, anunciava sutiãs com enchimento… para meninas de oito anos…
Consequentemente também a estes estímulos, a vivência da vida sexual se realiza cada vez mais cedo .
– Desejos estimulados (quer de produtos, quer de vivências – desde tomar cerveja até ter sucesso junto ao sexo oposto) e de difícil realização têm que ser reprimidos. Auto-reprimidos. E, quando isso não acontece, levam a transgressões.
– Essas transgressões tendem a ser socialmente punidas. E, no Brasil de hoje, discute-se até a redução da idade penal para determinados crimes e transgressões, ao invés de educar mais e melhor as crianças, e oferecer-lhes instrumentos que estimulem e facilitem a discriminação dos valores.
Adultização da infância
Conhecemos várias formas de adultização das crianças, contra as quais a sociedade tem procurado se posicionar e inibir: o trabalho infantil, a exposição a conteúdos violentos, o excesso de responsabilidades, a exposição precoce à sexualidade…
Entretanto, apesar das boas intenções que envolvem a proteção da infância, a questão fica mais difícil ao lembrarmos que na verdade ainda temos várias infâncias em nosso país dependendo da região, da cultura, das condições socioeconômicas, da raça/etnia, enfim…
Como podemos proteger as várias infâncias de uma forma mais concreta em termos de evitar a adultização precoce, a erotização, o desrespeito aos direitos das crianças, a brincar… Com que atores sociais podemos contar para isso?
A família, a escola e a mídia poderiam contribuir com isso.
Mas a família resiste ou não vive as condições necessárias que lhe permitam se posicionar criticamente.
Muitas das famílias mais modestas consideram que tiveram uma boa formação pelo fato de ter que trabalhar cedo  ao invés de “ficar por aí, à toa”.
Mães que não têm o hábito de diálogo e de controle que não passe pela punição física sentem falta do direito de palmada – já que seus filhos sabem e defendem os seus próprios direitos e elas perdem a capacidade de controle.
Finalmente, moradias mais precárias tornam as eventuais paredes do quarto porosas ao som das relações que ali se dão.
Por outro lado, o apelo ao consumo e aos modelos e valores dominantes que resultam nos problemas apontados acima são introjetados pela família, que não consegue se posicionar criticamente ante os trejeitos entre-ingênuos-e-sensuais de seus filhos, ante a roupa infantil à venda (sandália de salto, sutiãs recheados para meninas de oito anos etc.)
A escola, com professoras sobrecarregadas e não preparadas para essas discussões, ou mesmo ante o esforço concentrado para derrubar o que resolveram chamar de “ideologia de gênero” nos planos de educação, não parece juntar perspectivas para ser um espaço de discussão dos valores que defendemos.
Resta a mídia
Mas esta tem sido aqui justamente a disseminadora destes valores e estímulos, que terminam responsáveis pela erotização precoce das nossas crianças, e pelo seu consumismo. O conteúdo da programação e a publicidade têm se combinado nesta função, mais do que qualquer outra.
E que têm se manifestado nas letras do funk pesado, na exposição do corpo, no início precoce da vida sexual e da gravidez predominando entre as meninas caracterizadas como “nem-nem” (nem estudam, nem trabalham).
O estímulo ao consumo parece até a mais amena das manifestações. Mas, seu alcance diuturno e universal sensibiliza os que “podem” e os que “não podem” a vivenciá-lo.
A contenção e a superação dos desejos não realizados exigem, entre outras coisas, uma maturidade que as crianças não têm, e que vão construindo ao longo da vida. Mas, enquanto isso não ocorre, não é pouco comum a apropriação indevida do produto/objeto-do-desejo, tão sedutora e insistentemente anunciado.
Não nos deve passar despercebido o esforço da bancada conservadora em defesa da redução da maioridade penal. Quanto, desta tese absurda, não se sustenta também na transgressão  da “apropriação indevida” do que não lhe pertence e nem pode ser adquirido, ao invés de educar mais e melhor as crianças, e oferecer-lhes instrumentos que estimulem e facilitem a discriminação dos valores?
É possível enfrentar a mídia?
Se nós adultos somos impactados pela mídia, imagine o que acontece com as crianças! E não é apenas com relação à compra de produtos mas visões de mundo e modelos que são colocados de variadas formas. 
Falamos muito da necessidade de oferecermos para nossos filhos uma alimentação saudável, abrindo mão dos práticos alimentos ultra-processados.
As pesquisas porém mostram que, distraidamente, o que as crianças fazem mais frequentemente enquanto assistem à TV é comer – sem perceber – guloseimas, preferencialmente dessas anunciadas na TV, de alto valor calórico e baixo teor nutricional.
Além disso, a conciliação da vida profissional com a vida doméstica e cuidados com os filhos (a classicamente chamada “dupla jornada”), acaba sobrando pouco tempo para uma alimentação saudável. Sem uma readequação das tarefas domésticas entre homens e mulheres, fica muito difícil para a mulher dar conta de tudo.
Como decorrência disso, somado à vida sedentária que levamos, temos tido um aumento do sobrepeso da população, inclusive entre as crianças – o que preocupa, dado o risco de antecipação das doenças a isso associadas – como diabetes etc.
Mas o risco não está presente apenas nos produtos alimentares anunciados. Brinquedos, roupas, programas, valores, anúncios de bancos e de estilos de vida fazem também o seu caminho já nas mentes dos telespectadores infantis. Precisamos refletir criticamente sobre isso e ver o que podemos fazer a respeito.
Queremos, e podemos até certo ponto, estimular professores e outros atores sociais para discutir e construir uma postura crítica das crianças frente aos apelos de consumo. Queremos contribuir, não só sensibilizando e formando os professores, mas agindo diretamente no que for possível para minimizar estes efeitos.
Entretanto, quanto mais autonomia conseguirmos ajudar a implementar, mais rapidamente teremos o concurso de uma rede de multiplicadores, incluindo também as próprias crianças.
Assim, seria de fundamental importância que elas aprendessem a decodificar criticamente o conteúdo e as intenções da mídia que as atinge, em geral, e não apenas da publicidade identificada como tal.
Neste sentido, um curso de LEITURA CRÍTICA DA MÍDIA lhes daria essa autonomia, amplitude e profundidade.
Tal curso poderia ser dado desde a mais tenra infância, até a pós-graduação. Já temos inclusive uma experiência realizada no Rio de Janeiro em que as crianças, com uma câmera na mão, entendem como se otimiza, minimiza, neutraliza um aspecto qualquer de um cenário, dando-lhe mais – e menos – importância, enfatizando a interpretação que se quer que o espectador dê.
Podemos usar alguns países que têm este curso, como referência. Como, por exemplo, o Canadá.
Ali, eles se propõem a discutir:
– a forma como a mídia – enquanto educadora informal – influencia o comportamento e valores das crianças e adolescentes.
–  o estudo sobre a representação da violência nos meios de comunicação, como meio para a compreensão da verdadeira natureza das produções de entretenimento enquanto ficção. Compara a tipologia, frequência e contextualização das cenas de violência na programação, com os dados de sua ocorrência real no Canadá, e discute o impacto e consequência dessa inflação sobre o imaginário da população.
– Ensinar particularmente às meninas que a produção midiática, incluindo os programas e mídia noticiosa, são uma construção deliberada, uma escolha, e não “uma janela aberta sobre a realidade”, por mais que assim pretendam.
– o efeito da espetacularização dos dramas e cenas sangrentas, e da exploração e banalização das guerras e catástrofes naturais – com grande visibilidade mas sem sequência ou continuidade, que amortece os sentimentos normais de compaixão e empatia.
– o que justifica a associação cada vez mais frequente da violência como prerrogativa dos heróis?
– quem se beneficia do uso de violência? Qual a principal motivação?
– a facilidade maior de se exportar filmes e programação com ação e violência, que são mais facilmente entendidos por culturas distintas, do que comédias ou dramas de qualidade, que necessitam de sua contextualização cultural para serem entendidos.
– reações distintas frente a músicas, filmes, jogos etc., mediadas pelas distintas personalidades, histórias de vida, valores , referências etc.
E promovem reuniões periódicas entre professores da área para discutir a adequação da programação e dos efeitos do curso.
Com isso, passaríamos da triste memória da história da criança que, vestindo a roupa de super-homem que acabara de ganhar, se joga pela janela do terceiro andar, crente de que ela o fará voar… que sinaliza dramaticamente como a discriminação entre a realidade e a fantasia da propaganda leva tempo para ser construída… até termos cidadãos, de diversas idades, capazes de se proteger do jogo de sedução publicitário.
O caminho aumentaria a eficiência e efeito preventivo que temos trilhado e que  busca não permitir que haja comunicação publicitária diretamente dirigida às crianças.
A moderna tecnologia
A sobrecarga de notícias de violência transmitidos pela mídia é também responsável pela sensação de insegurança das mães que acreditam que seu filho estará mais seguro frente à TV, do que brincando na rua. Isso, somado à dificuldade de multiplicar o seu tempo de modo a fazer caber nele as inúmeras tarefas habitualmente atribuídas às mulheres, fez com que a TV passasse a ser vista como aliada, como uma boa babá eletrônica. Os feitos colaterais disso, vimos acima – obesidade precoce, vida sedentária, catequização pelos valores dominantes, mentalidade consumista etc.
Mas a tecnologia se moderniza e diversifica. Hoje, temos visto mães “ganhando um tempinho” para pensar, conversar com o marido, executar alguma tarefa qualquer, entregando … o celular ao seu filho de menos de dois anos… Este, por sua vez, concorre com os jogos eletrônicos por meio de tablets e iPads. O mundo real e as relações interpessoais vão perdendo espaço para o mundo virtual.
Desenvolvem uma capacidade de concentração e habilidade manual de muito superior à dos pais. Mas… que resultado teremos em termos da capacidade de percepção e interação do ambiente ao seu redor? De sua sociabilidade?
Isso, só pesquisas e o futuro dirão.
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*Rachel Moreno é psicóloga, pesquisadora, especialista em sexualidade humana e em meio ambiente, e integrante da Rede Brasileira Infância e Consumo.

sábado, 18 de março de 2017

UNICEF organiza fórum em SP sobre direitos da criança
O Brasil recebe pela primeira vez, no próximo dia 4 de abril, o Fórum Global da Criança (Global Child Forum), que ocorrerá em São Paulo. Sob o tema “Investir em cada criança”, o evento destacará formas de as empresas promoverem o avanço social e econômico na América do Sul, apoiando os direitos da infância e da adolescência.
Organizado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) e pela fundação Childhood Brasil, o encontro reunirá mais de 300 lideranças de empresas, governos, universidades e sociedade civil.
“Estamos muito satisfeitos por organizar o Global Child Forum na América do Sul, em São Paulo, uma das cidades e um dos centros de negócios mais vibrantes do mundo”, disse Åse Bäckström Saeed, diretora administrativa do Global Child Forum.
“Embora a prosperidade na América do Sul esteja aumentando, a região ainda tem desigualdades econômicas e socias. Este fórum vai desafiar as empresas a construir um futuro justo e sustentável para as crianças da região, integrando seus direitos às operações” corporativas, completou.
O fórum pretende compartilhar iniciativas empresariais que tenham a visão de um mundo sustentável em que os direitos das crianças sejam respeitados e apoiados.
O encontro terá a presença do rei da Suécia, Carl XVI Gustaf, presidente honorário do Global Child Forum, e da rainha Silvia da Suécia, além do presidente brasileiro, Michel Temer, e da primeira-dama Marcela Temer. A diretora regional do UNICEF para a América Latina e o Caribe, María Cristina Perceval, será uma das conferencistas.
A intenção é permitir que líderes empresariais e globais, bem como para especialistas, ONGs, governos e universidades, inspirem-se sobre novas maneiras de pensar que podem ser desenvolvidas para combater os crescentes desafios enfrentados pelas crianças da região.
Um dos destaques será o lançamento do estudo “O direito da criança e o setor empresarial na América do Sul”, feito em colaboração com Boston Consulting Group (BCG), que classifica as principais empresas da região de acordo com indicadores para os direitos da criança.
O Global Child Forum na América do Sul será realizado no prédio da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) somente para convidados. Se estiver interessado em participar, enviar e-mail para: SAM@globalchildforum.org.
Sobre o Global Child Forum
Fundado em 2009 pela família real sueca, o Global Child Forum é um fórum relevante para os direitos das crianças e empresas dedicadas ao pensamento inovador, ao compartilhamento de conhecimentos e ao networking.
Acredita no poder e na responsabilidade das empresas trabalhando em parceria com todas as partes da sociedade, para criar uma sociedade próspera, sustentável e justa para as crianças do mundo.
Além dos fóruns, o Global Child Forum oferece perspectivas de pesquisa, melhores práticas e ferramentas de avaliação de risco destinados a explorar oportunidades para que as empresas integrem os direitos das crianças em suas operações e comunidades. O presidente honorário do Global Child Forum é o rei da Suécia, Carl XVI Gustaf.
Para mais informações, visite: www.globalchildforum.org.
Para credenciamento de imprensa e solicitações de entrevistas:
Burson-Marsteller Brasil (55 11 3094 2240)
Elaine Rodrigues (elaine.rodrigues@bm.com; 55 11 3094 2267)
Rodrigo Santos (rodrigo.santos@bm.com; 55 11 3040 2413)
Fernanda Longon (fernanda.longon@bm.com; 55 11 3094 2289)

Para mais informações sobre o Global Child Forum:
Linda Lodding Global Child Forum
Gerente de Comunicação
Celular: +46 72 387 0248

sexta-feira, 17 de março de 2017

Código de Menores x ECA: Mudanças de Paradigmas

Lembrando o início da década de 90, veremos um período em que as organizações sociais, o MNMMR e vários profissionais engajados na luta pelos direitos da criança, comemorarem conquistas. A inclusão desses direitos na Constituição Federal Brasileira (1988) e a promulgação do ECA (1990). Quem pôde presenciar (mesmo que em filme , como eu) a participação de crianças e adolescentes num voto simbólico que ocorreu na Câmara Federal, dizendo sim ao ECA, sabe o quanto essa experiência foi gratificante.

Já refletindo sobre as mudanças entre o Código de Menores e o ECA, podemos afirmar que o ECA foi elaborado com a participação dos movimentos sociais. O caráter participativo deste processo é uma primeira e importante diferença. O protagonismo da sociedade se impõe pela expressão de seus interesses. É a democracia, também recentemente conquistada, se revelando pela prática da participação popular. É a proposição de nova ordem jurídica a partir da proposta de mudança de mentalidade da sociedade em relação às suas crianças e adolescentes.
Uma segunda mudança que merece destaque é o caráter universal dos direitos conferidos. Reside no reconhecimento legal do direito de todas as crianças e adolescentes à cidadania independentemente da classe social (Pino, 1990). Enquanto o antigo CM destinava-se somente àqueles em “situação irregular” ou inadaptados, a nova Lei diz que TODAS as crianças e adolescentes são sujeitos de direitos. Eis, no meu ponto de vista, uma mudança de paradigma.

No Código, havia um caráter discriminatório, que associava a pobreza à “delinquência”, encobrindo as reais causas das dificuldades vividas por esse público, a enorme desigualdade de renda e a falta de alternativas de vida. Essa inferiorização das classes populares continha a idéia de norma, à qual todos deveriam se enquadrar. Como se os mais pobres tivessem um comportamento desviante e uma certa “tendência natural à desordem”. Portanto, inaptos a conviver em sociedade. Natural que fossem condenados à segregação. Os meninos que pertenciam a esse segmento da população, considerados “carentes, infratores ou abandonados” eram, na verdade, vítimas da falta de  proteção. Mas, a norma lhes impunha vigilância.

Além disso, o antigo Código funcionava como instrumento de controle, transferindo para o Estado a tutela dos “menores inadapatados” e assim, justificava a ação dos aparelhos repressivos. Ao contrário, o ECA serve como instrumento de exigibilidade de direitos àqueles que estão vulnerabilizados pela sua violação.

O reconhecimento da criança e do adolescente como sujeitos de direitos, e não mais como simples portadores de carências (Costa,1990), despersonaliza o fenômeno, e principalmente, responsabiliza toda sociedade pela criação das condições necessárias ao cumprimento do novo direito.

Isso não significa negar a relação de dependência das crianças aos adultos e nem a responsabilidade que os últimos têm quanto ao desenvolvimento dos primeiros. Contudo, significa impedir a ocorrência daquilo que, nesta relação, traz a marca do autoritarismo, da violência e do sofrimento (Teixeira, 1991). Ao assumir que a criança e o adolescente são “pessoas em desenvolvimento”, a nova Lei deixa de responsabilizar algumas crianças pela irresponsabilidade dos adultos. Agora, são TODOS os adultos que devem assumir a responsabilidade pelos seus atos em relação às TODAS as crianças e aos adolescentes.

A mudança na referência nominal também contém uma diferença de paradigma. A expressão “menor” é substituída por “criança ou adolescente” para negar o conceito de incapacidade na infância. O conceito de infância ligado à expressão “menoridade” contém em si a idéia de não ter. Ser “menor” significa não ter dezoito anos e, portanto, não ter capacidades, não ter atingido um estágio de plenitude e não ter, inclusive, direitos (Volpi, 2000). O paradigma evolucionista aqui revelado, fundamentava a teoria de desenvolvimento infantil desenvolvida a partir das competências específicas dos adultos.

Com a formulação do ECA, inicia-se um debate para compreender as competências e capacidades da população infanto-juvenil. O paradigma muda, os menores passam a ser denominados crianças e adolescentes em situação peculiar de desenvolvimento. As crianças e adolescentes passam a ser vistos pelo seu presente, pelas possibilidades que têm nessa idade e não pelo futuro, pela esperança do que virão a ser. Isto significa trazer à tona a positividade do conceito de infância, que é marcada pela PROVISORIEDADE E SINGULARIDADE. Uma  constante metamorfose. Um ser que é processual.
Insisto na idéia da SINGULARIDADE vivida pelas crianças e adolescentes. São seres sócio-históricos que não apenas reagem às determinações sociais, mas são também SUJEITOS de ações. Participam de um momento histórico em que criam e transformam sua existência, a partir de suas experiências cotidianas, que são vividas de forma singular.

Neste sentido, o que define a adolescência  não é uma crise inerente à uma idade. Nem uma essência biológica universal. É um conjunto de características, que inscreve uma qualidade de pensamento que é diferente na infância e na idade considerada adulta. Uma qualidade de pensamento que possibilita a reflexão sobre os significados e sentidos de seus interesses.

Ressalto com isso, que a adolescência não pode ser considerada como uma fase propícia à transgressão. A atuação do adolescente depende das relações que ele vive e das que ele conhece no meio social. Ele atribui SENTIDOS a estas vivências e estes vão  servir como parâmetros para suas futuras relações. Sabemos que quanto mais amplo e diversificado for o universo cultural do indivíduo, maior a possibilidade de seu desenvolvimento, conhecimento do mundo, de seus próprios interesses e de sua capacidade de criação.

Não podemos encarar as crises vividas na adolescência como patológicas e nem criar um modelo único de adolescência. Algumas concepções de adolescência negam os aspectos culturais e políticos. Descontextualizam a adolescência, criando estereótipos que impedem a compreensão mais ampla deste fenômeno. Aí veremos as crises como desarranjos, já que a harmonia é “pressuposto natural” (Vygotsky, 1998). O desenvolvimento de um indivíduo não é movido pela harmonia, mas pelas contradições, pelos confrontos. Essas contradições são próprias do desenvolvimento humano em qualquer momento da vida, não se limitam à adolescência. Esta forma de compreensão deve afastar a idéia de transgressão ligada à adolescência. Se pensarmos a adolescência como fenômeno psicossocial, não devemos considerá-los como potenciais agressores. A forma como a adolescência será vivida por cada indivíduo vai depender das condições dadas para seu desenvolvimento. Vai depender do respeito ao seu direito de sobreviver, da garantia de sua integridade física, psicológica e moral.

Neste ponto, o ECA propõe um reordenamento institucional. Rompe com práticas fundadas na filantropia ou caridade (Pino, 1990) e institui uma nova ordem onde os direitos das crianças geram responsabilidades para a família, para o Estado e para a sociedade. Responsabilidades pela criação e implementação das políticas sociais relativas a esses direitos.

Neste campo, o Estatuto introduz um elemento novo que é a constituição de Conselhos de direitos e dos tutelares. Elementos fundamentais para as novas políticas de atendimento, os conselhos também são espaços de participação da sociedade organizada. Governo e sociedade, juntos, assumem responsabilidade pela formulação e controle das ações relativas aos direitos da Criança e do Adolescente.

Apesar das importantes mudanças de paradigma, sabemos que, olhando para a prática, o saldo destes 12 anos não é muito positivo. Sejamos mais claros/as: o ECA não foi implementado. É fato que algumas políticas públicas passaram por reformulações, mas, infelizmente, nem todos atendem às concepções expressas na legislação vigente.

Destacamos aqui, o atendimento aos adolescentes autores de ato infracional. O próprio Ministério da Justiça fez, em 1997, um levantamento nacional do atendimento às medidas sócio educativas que mostrava a não implementação do ECA (Apud, Teixeira, 2002).

No caso da privação de liberdade aqui em São Paulo, o problema está na persistência de uma prática repressiva e no descumprimento das garantias e prerrogativas legais. Estamos há doze anos transcorridos da promulgação do ECA e ainda não foram realizadas, na Febem Paulista, as necessárias adequações à nova legislação. Num rápido panorama deste quadro, vemos a omissão das autoridades responsáveis e a “preferência” pela aplicação de medidas de privação de liberdade nos casos em que caberiam medidas sócio-educativas em meio aberto . Também é fato que os adolescentes autores de ato infracional que estão privados de liberdade, vivem esta situação sob a lógica da “Tranca e couro” , quer dizer, estão sendo TORTURADOS cotidianamente.

As inúmeras rebeliões  são um duro emblema da negligência aos direitos conquistados com a nova legislação, dita aliás, pelos próprios adolescentes que encontram-se encarcerados. No último sábado(13/07/02), assistimos a mais uma: Franco da Rocha com a entrada da Tropa de Choque para contê-la.

A desumanidade e crueldade vão desnudando variadas formas e métodos de humilhação e  agressão. A imagem vinda do relato de adolescentes que apanham com ferros/tacos que trazem inscritas as palavras Direitos Humanos e ECA , entre outras,  é o próprio retrato/desenho esculpido do reverso da lei.

Vemos ainda, projetos retrógrados de propostas de redução da idade de imputabilidade penal, além do discurso de pessoas que acreditam ainda que o ECA serve apenas para encobrir atos delituosos de adolescentes, protegê-los, retirando-lhes a responsabilidade. Aqui temos também um outro problema , o da mudança de mentalidade, tarefa esta que depende também de um processo histórico e da vontade política de educadores e profissionais na discussão do ECA.

Mas como nos mostra Chauí (1994):
“Se nascemos numa sociedade que nos ensina certos valores morais -justiça, igualdade, veracidade, generosidade, coragem, amizade, direito à felicidade – e, no entanto, impede a concretização deles porque está organizada e estruturada de modo a impedi-los, o reconhecimento da contradição entre o ideal e a realidade é o primeiro momento da liberdade e da vida ética como recusa da violência. O segundo momento é a busca de brechas pelas quais possa passar o possível, isto é, uma outra sociedade, que concretize no real aquilo que a nossa propõe no ideal…O terceiro momento é o da nossa decisão de agir e da escolha dos meios para a ação. O último momento da liberdade é a realização da ação para transformar um possível num real, uma possibilidade numa realidade”(Chauí, p.365). E essas últimas tarefas, se fazem, para nós, muito urgentes… não temos mais tempo a perder.

É preciso comemorar os doze anos do ECA, com a certeza, de que, se ainda não conseguimos implementá-lo, buscamos caminhos. É preciso ousar sonhar e ousar transformar. É necessário uma maior e melhor organização de todos os setores da sociedade com a força e felicidade humanas, compartilhando a idéia de que a diferença e o outro são importantes para o desenvolvimento de cada um de nós…A lei já nos fortalece…

Referências bibliográficas
COSTA, A.C.G.da O novo direito da infância e da juventude do Brasil: 10 anos do EFA – Avaliando conquistas e projetando metas. Cad.1- Unicef, 1990.
PINO, A. Direitos e realidade social da criança no Brasil. A propósito do “Estatuto da Criança e do Adolescente”. Revista Educação & Sociedade, ano XI, n.36, p.61-79, ago., 1990.
TEIXIEIRA, M.L.T. O estudo da criança e do adolescente   e a questão do delito.  Cadernos Populares/n.3, Sitraemfa, 1991.
TEIXIEIRA, M.L.T. Adolescência – violência: uma ferida de nosso tempo. São Paulo, 2002. . Tese (Doutorado). Serviço Social, PUC/SP.
VOLPI, M.(UNICEF) I Encontro Estadual de Educação Social na rua. São Paulo, jul,2000 (Palestra).
VYGOTSKY,L.S. Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 5ªed., 1998.
Ana Silvia Ariza de Souza é psicóloga e mestre em Psicologia Social pela PUC-SP

terça-feira, 14 de março de 2017

Relatora da ONU recomenda medidas para combater adoção ilegal no mundo


A relatora especial da ONU sobre comércio de crianças, Maud de Boer-Buquicchio, recomendou na terça-feira (7) novas medidas de combate às adoções ilegais no mundo, incluindo propostas para enfrentar os sistemas em que tais práticas ocorrem.
Boer-Buquicchio criticou os governos em todo o mundo pela falta de respostas estatais adequadas aos direitos das vítimas de adoções ilegais. Ela também citou uma variedade de atos e práticas ilegais que resultam em adoções ilícitas e seus impactos nos direitos das crianças.
“Não existe direito de adotar ou de ser adotado. As adoções ilegais constituem violações aos direitos das crianças, desde a privação arbitrária da identidade até à exploração através da venda”, destacou.
“Um fator importante por trás das adoções ilegais é o ganho financeiro que pode ser obtido com a aquisição de crianças para adoção, em especial para a adoção internacional”, disse.
Ela afirmou que enquanto os processos de adoção não forem transparentes e as doações aos países de origem estiverem vinculadas à disponibilização de crianças para adoção, os incentivos para adoções ilegais continuarão existindo.
“A adoção, particularmente na sua forma multinacional, é atualmente a única medida com um objetivo de proteção da criança que exige o desembolso de fundos por aqueles que devem fornecer essa proteção. Como resultado, a adoção passou de uma prática centrada na criança para uma que está subordinada aos desejos e necessidades dos futuros pais adotivos”, disse a relatora.
“Isso criou um terreno fértil para a aquisição e venda de crianças, juntamente com outros crimes que dão origem a adoções ilegais”, acrescentou.
Entre as recomendações feitas por Boer-Buquicchio estão: promover investigações e ações judiciais dirigidas às redes criminosas envolvidas no comércio ilegal de crianças; fornecer mais investimentos para os sistemas de proteção de crianças; criar mecanismos de supervisão eficazes para prevenir, detectar e denunciar o crime etc.
“É vital que o país de origem da criança e o Estado receptor reconheçam e abordem eficazmente os problemas sistêmicos envolvidos”, frisou.
O relatório da especialista também examina investigações acerca de vítimas de adoções ilegais em busca de verdade sobre suas origens, responsabilidade, reparações por meio de reformas legislativas, políticas e institucionais.
“Os Estados devem reconhecer sua responsabilidade em relação às adoções ilegais, antecipando estratégias e adotando medidas abrangentes de reparação às vítimas. Devem também facilitar o acesso aos registos de adoção e aos serviços de rastreio, e ainda apoiar o reagrupamento de famílias que foram separadas por adoção forçada ou ilegal.”
“É preciso que todas as partes interessadas coloquem os melhores interesses da criança no centro das adoções”, advertiu.
Fonte: www.onu.org.br

quinta-feira, 9 de março de 2017

Sistema de Garantia dos Direitos, o corpo social para garantir direitos de crianças e adolescentes


O Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente (SGDCA) consolidou-se a partir da Resolução 113 do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) de 2006. O início do processo de formação do SGD, porém, é fruto de uma mobilização anterior, marcada pela Constituição de 1988 e pela promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), como parâmetro para políticas públicas voltadas para crianças e jovens, em 1990.

O SGDCA é formado pela integração e a articulação entre o Estado, as famílias e a sociedade civil como um todo, para garantir que a lei seja cumprida, que as conquistas do ECA e da Constituição de 1988 (no seu Artigo 227) não sejam letra morta.

De forma articulada e sincrônica, o SGDCA estrutura-se em três grandes eixos estratégicos de atuação: Defesa, Promoção e Controle. Essa divisão nos ajuda a entender em quais campos age cada ator envolvido e assim podemos cobrar de nossos representantes suas responsabilidades, assim como entender as nossas como cidadãos dentro do Sistema.

Por um lado, temos as leis e as instâncias judiciais que devem garantir a Defesa, a fiscalização e sanções quando detectarmos o descumprimento de leis. Instâncias do Judiciário, conjuntamente com organizações da sociedade civil, devem zelar para que a lei seja aplicada de fato. Um dos principais órgãos é o Conselho Tutelar, que está na ponta da abordagem com a sociedade e funciona como um guardião, ao observar e encaminhar em campo os casos de violações dos direitos que podem vir a ocorrer com crianças e adolescentes. Outro ator sobre o qual ouvimos muito falar é o promotor do Ministério Público, que age em casos de abusos dos direitos. São exemplos do que podemos entender como Defesa.

Já no eixo da Promoção estão todos os responsáveis por executar o direito, transformá-lo em ação. Nessa perspectiva, os professores e os profissionais da educação são os atores que executam o direito à educação, enquanto médicos, enfermeiros e outros profissionais que trabalham em clínicas, hospitais, postos de saúde e afins são os responsáveis pela realização do direito à saúde. Considerando todas as necessidades básicas (alimentação, vestuário, remédio, educação, profissionalização), serão inúmeros os atores sociais e equipamentos relacionados – de organizações da sociedade civil organizada, inciativa privada e instituições governamentais.

O governo também exerce um papel importante na promoção de direitos, por exemplo, com políticas sociais, como o Bolsa-Família. Este é parte integrante do Sistema de Garantias, pois, numa visão abrangente, deve ser garantida a autonomia financeira familiar. Em 1996, o Governo Federal criou o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), cujo objetivo era unir essas diversas esferas de uma forma mais orgânica para erradicar o trabalho infantil. Foi criado em 1991 o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), “a instância máxima de formulação, deliberação e controle das políticas públicas para a infância e a adolescência na esfera federal”. Trata-se do órgão responsável por tornar efetivo os direitos, princípios e diretrizes contidos no ECA. No âmbito estadual, um exemplo de promoção é a realização de Medidas Socioeducativas. Este é um assunto polêmico no Brasil, devido aos frequentes escândalos de abuso que vemos contra adolescentes nas unidades de internação do país. O trabalho da Assistência Social também entraria nesse campo.

Por último, temos o eixo do Controle, e aqui ganham destaque os Conselhos de Direitos. Os Conselhos são espaço de participação da sociedade civil para a construção democrática de políticas públicas. São espaços institucionais para o cidadão formular, supervisionar e avaliar políticas públicas junto a representantes do governo. Eles podem ter caráter deliberativo, normativo ou consultivo.

Há Conselhos atuantes no âmbito municipal, estadual e nacional, como o Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente; o Conselho da Assistência Social; da Educação e da Saúde.

terça-feira, 7 de março de 2017

Rádio pode promover direitos humanos e unir comunidades, diz UNESCO

Em mensagem para o Dia Mundial do Rádio, a diretora-geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), Irina Bokova, afirmou que esse meio de comunicação “é uma força para a dignidade e os direitos humanos”. Segundo a dirigente, em meio à revolução na forma como compartilhamos informação, o rádio permanece uma plataforma sólida para unir comunidades.
“A alfabetização midiática e informacional nunca foi tão essencial, para construir a confiança na informação e no conhecimento, em uma época em que as noções de ‘verdade’ são desafiadas”, alertou a chefe da UNESCO.
Para Bokova, é “por isso (que) o rádio pode oferecer um direcionamento para soluções inovadoras para problemas locais, e também continuar avançando nas áreas de direitos humanos, igualdade de gênero, diálogo e paz”.
“O rádio fornece uma voz para mulheres e homens de todas as partes. Ele escuta seus públicos e responde a suas necessidades”, disse a dirigente, que descreveu o meio de comunicação como “um poderoso catalisador de soluções para os desafios enfrentados pelas sociedades”.
“No caminho do trabalho, em nossas casas, escritórios e espaços abertos, em momentos de paz, de conflitos e emergências, o rádio continua a ser uma fonte essencial de informação e conhecimento, abrangendo diferentes gerações e culturas, inspirando-nos com a riqueza da diversidade humana e conectando-nos com o mundo”, acrescentou Bokova.
Em apelo por um compromisso renovado de audiências e comunicadores com o rádio, a diretora-geral elogiou políticas de participação do público que trazem os ouvintes para o centro das emissões radiofônicas.
“O rádio é importante para fazer avançar a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável”, lembrou Bokova. De acordo com a chefe da UNESCO, programas de rádio podem abordar temas como a mudança climática e as divisões da sociedade, promovendo debates inclusivos.
“O avanço nas liberdades fundamentais e a promoção do acesso público à informação são elementos essenciais para fortalecer a boa governança e o Estado de Direito, assim como para aprofundar a inclusão e o diálogo”, completou.
Fonte: ONU Brasil

segunda-feira, 6 de março de 2017

Câmara aprova Projeto que garante direitos de crianças vítimas de violência


A Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 3792/15, da deputada Maria do Rosário (PT-RS) e outros parlamentares, que cria um sistema de garantia de direitos para crianças e adolescentes que sejam testemunhas ou vítimas de violência, evitando a revitimização que ocorre atualmente quando eles necessitam narrar os fatos diversas vezes. O Brasil ainda não possui uma legislação específica sobre o tema. Pelo projeto, União, Estados, Municípios e Distrito Federal devem se articular em políticas públicas que resguardem os direitos de crianças e adolescentes e os protejam de situações de violência ou ofereçam acolhimento.
“Frequentemente o que se vê é a falta de consideração quanto à condição de pessoas em desenvolvimento. A importância desta matéria reside no modo como se deve proceder para amparar, escutar, ouvir, crianças vítimas e testemunhas de violência nos diversos âmbitos do Poder Público, seja na segurança pública, na justiça ou na rede de proteção de modo geral”, destacou Maria do Rosário. O PL, que teve relatoria da deputada Laura Carneiro (PMDB-RJ), segue agora para o Senado.
A proposta prevê que sejam realizadas, periodicamente, campanhas de conscientização da sociedade, estimulando a mais rápida identificação da violência praticada contra crianças e adolescentes e a difusão dos direitos e dos serviços de proteção. A matéria também determina regras para os depoimentos dados por elas, com a garantia, por exemplo, que as vítimas de violência, especialmente sexual, sejam ouvidas apenas por profissionais devidamente capacitados dos órgãos da saúde, assistência social e segurança responsáveis diretamente pelo atendimento dessas situações.
O projeto contou com a ajuda de especialistas que integraram o grupo de trabalho sobre o Marco Normativo da Escuta de Crianças e Adolescentes, contemplando recomendações baseadas em normativas internacionais e na prática de tomada de depoimentos especiais em distintos países. Associações e entidades como a Unicef, a Associação Brasileira de Psicologia Jurídica, Childhood e Think Olga também apoiaram na elaboração da proposta. “A criança e o adolescente pagam um alto preço por entrarem em contato com o universo da violência, como vítimas ou testemunhas”, disse Maria do Rosário, que coordena da Frente Parlamentar de Proteção e Defesa das Crianças e dos Adolescentes.
Resumo do PL 3792/15:
Os sistemas de Justiça, segurança pública, assistência social e saúde devem adotar ações articuladas no atendimento das vítimas, por exemplo:
– Criação de atendimento telefônico ou serviços de resposta telefônica, inclusive por meio da Internet, para denúncias de abuso e de exploração sexual;
– Previsão de serviços de referência no Sistema Único de Saúde para atenção a crianças e adolescente em situação de violência sexual, com atendimento clínico e psicológico, informação prévia das etapas do atendimento, exames e medicação necessários, entre outros;
– Serviços de referência em Assistência Social, com elaboração de planos familiares de atendimento, avaliação de situações de intimidação, possibilidade de inclusão em programas de proteção a testemunhas ou programas de transferência de renda;
–  Previsão de delegacias especializadas no atendimento de crianças ou adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, com equipe multidisciplinar, cuidados na tomada de depoimentos e previsão de medidas de proteção se constatado risco a criança;
–  Criação de varas especializadas em crimes contra a criança e adolescente para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência contra criança e adolescente, dotados de equipe multidisciplinar especializada no atendimento à vítima;
–  Os municípios poderão criar Centros Integrados de Atendimento que proporcionem atenção e atendimento integral e interinstitucional às crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas.
Fonte: Sul21